Centro Clínico Interdisciplinar Verstandig CRP 06/5814
Psicologia  Transtorno Bipolar

          A ideia de uma doença como o transtorno bipolar existe há milênios, mas desapareceu na Idade Média, quando todas as doenças mentais eram abordadas de forma mística ou religiosa. O primeiro médico a relatar a mania como conhecemos hoje (episódio maníaco dentro do transtorno bipolar tipo I) foi o grego Areteus da Capadócia (Alexandria, final do século I a.C.). Areteus foi também o primeiro a associar a mania com a depressão (melancolia), descrevendo indivíduos que passavam por períodos alternados ao longo da vida.

           Até o século XIX, muitas observações foram feitas, mas a relação entre mania e depressão não foi relatada. Dois franceses (Falret e Baillarger) e um alemão (Kraepelin) finalmente correlacionaram os dois polos, constituintes de uma mesma doença, na qual o humor ou afeto está prejudicado. Essa ideia permanece praticamente a mesma até hoje. 


          Vale a pena ressaltar que o termo grego mania, na sua ideia original, significa “loucura enfurecida” (algo bem próximo do que ocorre nos episódios mais graves do que conhecemos hoje como episódio maníaco). Infelizmente, o termo também foi – e continua sendo – usado para descrever outros estados que não se parecem com seu conceito original. Outro ponto importante é que os transtornos do humor possuem uma origem biológica, mas fatores precipitantes psicológicos e sociais também participam de seu desencadeamento.


          A principal mudança ocorrida no conceito original da Psicose Maníaco Depressiva até os dias atuais foi a separação de suas formas de doença puramente depressiva. Essa separação é relativamente recente, datando de 1966, quando Jules Angst (na Suíça) e Carlo Perris (na Suécia) publicaram trabalhos independentes, os quais indicavam que pacientes que sofriam apenas de depressão, hoje conhecidos como “unipolares” ou portadores de depressão unipolar, apresentavam histórico familiar predominantemente de depressão, enquanto aqueles que apresentavam episódios de mania, com ou sem episódios de depressão, apresentavam histórico familiar tanto de mania como de depressão.


          Hoje, chamamos de ciclotímicas as pessoas que têm flutuações do humor para cima e para baixo, mas que nunca preenchem os critérios para um episódio de mania ou de depressão. Hipertímico é o indivíduo que está sempre um pouco para cima, além do que seria considerado normal para a maioria das pessoas, enquanto distímico é aquele que está sempre um pouco mais para baixo.


          O próprio TB (Transtorno Bipolar) foi dividido em “TB tipo I”, que se refere àqueles pacientes que apresentam episódios de mania ou estados mistos, e “TB tipo II”, para os que exibem episódios de depressão e de hipomania – uma mania mais leve, mas de intensidade que chama atenção, indicando uma clara mudança de comportamento. Esses episódios costumam se repetir inúmeras vezes ao longo da vida, entre períodos de depressão, ou os chamados sintomas mistos. Pode haver períodos de volta à normalidade que podem durar meses ou anos, mas, uma vez diagnosticado o TB, sempre haverá o risco da ocorrência de novos episódios ao longo da vida do paciente. 


          Na doença bipolar, encontramos a presença de vários sintomas e sinais que compõem o chamado episódio depressivo ou maníaco/hipomaníaco. Nela, os sintomas persistem durante a maior parte do tempo; duram pelo menos 15 dias, no caso do episódio depressivo, ou quatro, no caso do episódio maníaco/hipomaníaco; e causam sofrimento e prejuízo no funcionamento global habitual do paciente. O TB é uma doença que interfere muito na vida do paciente, da sua família e da sociedade, causando prejuízos geralmente irreparáveis na saúde, na reputação e nas finanças do indivíduo e/ou da família, além do sofrimento psicológico acarretado para todos os envolvidos.


          Normalmente, o TB começa com uma depressão, muitas vezes já na adolescência. Ainda que leve, a depressão é mais frequente que períodos de hipomania ou mania no TB ao longo da vida. Durante esses episódios, o estado de humor é depressivo ou irritável, hipersensível a eventos considerados negativos, e o paciente não consegue reagir a estímulos positivos ou prazerosos, podendo predominar a apatia. O episódio depressivo pode se apresentar de várias formas dependendo de suas características clínicas e evolutivas (ao longo da vida) que constituem os chamados subtipos ou formas clínicas de apresentação do episódio.


          Já a distimia pode ser um estágio anterior ao aparecimento do TB; é um estado depressivo de intensidade leve e com duração crônica (mais do que 2 anos), marcado por sentimentos frequentes de insatisfação e pessimismo. A maioria dos pacientes desenvolve francos episódios depressivos durante a vida, e seu quadro clínico é semelhante ao das outras depressões, porém com poucos sintomas e de intensidade mais leve e persistente ao longo do tempo. Devido à durabilidade, os sintomas são interpretados pelas pessoas como características da sua personalidade. Não são incapacitantes, mas comprometem o rendimento profissional e interferem nas relações sociais e familiares. O paciente funciona sempre abaixo do seu potencial máximo de capacidade.


         A depressão bipolar é igual às outras depressões, mas aumento do sono e de fome e/ou peso são mais comuns na depressão bipolar. É muito importante diferenciar a depressão bipolar da depressão que não é bipolar (unipolar), porque os antidepressivos, que são o principal tratamento da depressão unipolar, podem piorar os sintomas e o desenvolvimento do TB durante a vida.


         Nos episódios de mania e hipomania o paciente costuma ter humor expansivo ou irritabilidade com sentimentos que tendem para o positivo e aumento da atividade ou de tempo ocupado; a aparência pode tornar-se mais chamativa, colorida, ou até mesmo inadequada ou bizarra; além disso, aumenta a sensibilidade ao estresse, a reatividade a tudo e a busca por estímulos. O paciente está mais ocupado consigo e suas atividades e ideias, criando uma falsa sensação de ocupação e eficiência, quando na realidade se atrapalha mais, se desorganiza, se desentende mais, se agita, mas descuida de si mesmo e do seu entorno. Os sintomas variam de intensidade em diferentes episódios e de um paciente a outro.

         Na mania, geralmente falta a autocrítica e a pessoa não enxerga os problemas que ocasiona, nem a alteração do próprio comportamento, e não aceita nem ouve o que outros dizem, principalmente se for contrário ao que pensa, porque distorce tudo. Evidentemente podem acontecer consequências graves e irreversíveis para si e a família em todos os âmbitos da vida, inclusive fatais ou ligados à justiça. 


         A hipomania é uma forma de mania atenuada, difícil de diagnosticar por ser mais leve em termos de sintomas, duração e consequências, nunca sendo psicótica nem causando prejuízos à pessoa ou a sua família. No hipomaníaco, as coisas de repente são mais urgentes, existe pressa e obstinação por qualquer coisa - e sempre é algo que se torna desproporcionalmente importante naquele momento. O aumento da energia física e/ou mental é difícil de identificar porque não há queixas, como se fazer ou pensar muito fosse parte do seu ser ou apenas um momento bom na vida.


         Por fim, a ciclotimia se caracteriza por leves e curtas alterações bifásicas de humor, energia, sentimentos, pensamentos e comportamentos que oscilam entre depressão e hipomania, sem jamais preencher os critérios diagnósticos de episódio depressivo e hipomania, e que duraram pelo menos dois anos. Pode representar formas iniciais de um TB ou perdurar ao longo da vida sem agravamentos maiores. Quando as oscilações do humor são acentuadas e se associam a diversos conflitos interpessoais e rompimentos, muitos ciclotímicos recebem incorretamente o diagnóstico de transtorno da personalidade borderline ou outros transtornos da personalidade.


         O tratamento adequado do TB envolve o uso de medicamentos chamados de estabilizadores do humor e requer mudanças no estilo de vida do paciente, sendo fundamental a psicoeducação sobre a doença e seu tratamento para a família e o paciente; em alguns casos, a orientação psicológica se faz necessária com profissionais que conheçam a fundo a doença bipolar. Embora não exista cura, com o tratamento adequado, a doença pode ser controlada, assim como acontece no diabetes, na hipertensão arterial e em outros problemas médicos crônicos. O paciente pode ter uma vida normal ou, no mínimo, muito próxima do seu normal.


Aprendendo a viver com o transtorno bipolar: manual educativo / Ricardo Alberto Moreno...[et al.] - Porto Alegre: Artmed, 2015


Márcia Verständig  - CRP. 06/29734

Caren Murai


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